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Comissão de juristas pode alterar custas judiciais e CARF
Criada há quase três meses, a comissão de juristas que pretende modernizar os processos administrativo e tributário está entrando em temas que impactam o dia a dia dos contribuintes.
Criada há quase três meses, a comissão de juristas que pretende modernizar os processos administrativo e tributário está entrando em temas que impactam o dia a dia dos contribuintes. Há previsão de mudanças em seis leis – só na parte fiscal. Uma das discussões mais avançadas no grupo trata sobre o pagamento de custas na Justiça Federal. Os valores devem aumentar. No dia de hoje, além disso, a comissão se reúne para discutir uma das partes mais polêmicas das reformas.
Envolve o processo tributário administrativo federal – atualmente disciplinado pelo Decreto nº 70.235, de 1972. O centro dos debates, aqui, é o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), última instância para o contribuinte recorrer das cobranças da Receita Federal. Há propostas em mesa, por exemplo, sobre o fim do voto de qualidade – a antiga sistemática de desempate dos julgamentos – e sobre a possibilidade de redução de multas aplicadas pelos fiscais em autos de infração. Existe histórica divergência entre Fisco e advogados de contribuintes sobre esses dois temas. O martelo sobre o que se tornará anteprojeto de lei e o que será descartado, no entanto, só será batido no dia 23 de junho. Essa é a data marcada para a última reunião geral do grupo.
A comissão foi criada pelos presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, e do Senado, Rodrigo Pacheco, com o objetivo de reformar os processos administrativo e tributário. Está sob a liderança da ministra Regina Helena Costa, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ela dividiu a comissão em duas: uma subcomissão de direito administrativo, que tem como presidente e relator Valter Schuenquener de Araújo, e uma subcomissão de direito tributário, liderada por Marcus Lívio Gomes. “Acredito que existem grandes desafios em ambas as instâncias, sendo nosso foco a atualização da legislação pertinente e a redução da litigiosidade”, diz. Os dois grupos estão trabalhando paralelamente nos dois temas, mas a deliberação das propostas será feita de forma conjunta. Há uma reunião plenária agendada para o dia 26 de maio e outra, a final, em 23 de junho. Julho ficará reservado para a redação dos textos e a apresentação aos presidentes do STF e do Senado está prevista para agosto. Marcus Lívio Gomes, que preside a subcomissão de direito tributário, é professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e secretário especial de Programas, Pesquisas e Gestão Estratégica do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ele tem, no grupo, advogados privados, que atuam para contribuintes, e representantes da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e da Receita Federal. Gomes explica ao Valor que, na sua subcomissão, grupos de dois ou três profissionais foram destacados para fazer o texto-base de cada um dos seis temas em discussão. Esse texto é enviado ao relator, que faz um primeiro filtro, e, depois, disponibilizado para todos os integrantes.
Isso vem acontecendo em etapas. No dia 19 de abril, a subcomissão debateu sobre a reforma da Lei de Custas do Poder Judiciário Federal. Gomes não abriu a redação da proposta. Mas indica que haverá aumento. O grupo identificou, por meio de documentos do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ, que os valores atuais estão muito defasados. A arrecadação com as custas cobre só 1,2% de toda a despesa. Nos tribunais estaduais, para efeito de comparação, o percentual médio é de 21%. As custas da Justiça Federal estão fixadas em unidade fiscal (UFIR) que, na esfera federal, não tem atualização desde o ano 2000. O teto estabelecido, além disso, é de R$ 2 mil – mesmo para discussões bilionárias, aplica-se esse valor.
Em outros tribunais, ele afirma, varia entre R$ 30 mil e R$ 80 mil. Gomes diz que antes de ser transportada para o anteprojeto de lei, a tabela de custas sugerida pelo grupo será submetida ao Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ para que seja emitida uma nota técnica sobre a previsão de arrecadação – se a sugestão ainda fica aquém, se está adequada ou vai além do que se busca. Não estão previstas alterações, no entanto, para a justiça gratuita. O segundo tema da lista dos seis está sendo deliberado pelos integrantes da subcomissão no dia de hoje. Trata da reforma do processo administrativo tributário federal – e, aqui, entram as questões polêmicas do Carf. Existe proposta de redução da chamada multa de ofício. Toda vez que um contribuinte sofre um auto de infração, ele recebe, automaticamente, um multa de 75% sobre os valores que estão sendo cobrados. A ideia que está em debate é que os conselheiros do Carf possam calibrar essa multa – 75% seria o teto.
Países que utilizam sistema jurídico semelhante ao brasileiro (Portugal, Espanha, Itália e França) têm medidas que possibilitam essa redução e poderiam ser replicadas aqui. “Temas como a individualização da sanção, evitando que todos os contribuintes sofram as mesmas penalidades independentemente das circunstâncias do caso concreto, estão sendo discutidos com profundidade. Provavelmente chegaremos a uma proposta que signifique evolução”, diz Luiz Gustavo Bichara, que integra a subcomissão. Em relação ao chamado voto de qualidade – extinto em abril de 2020 -, o próprio Marcus Lívio Gomes, que preside a subcomissão, apresentou proposta. Ele entende que o novo critério de desempate, em favor do contribuinte, impede que exista jurisprudência administrativa e judicial sobre algumas matérias. O Carf é um órgão paritário: metade dos julgadores da turma são auditores fiscais e a outra metade representantes de contribuintes. Casos complexos e de alto valor – os bilionários, que envolvem amortização de ágio, lucros no exterior e planejamento tributário, por exemplo – frisa Gomes, geralmente o que se vê é formação de voto de bancada. Com as turmas divididas, os processos terminam em empate e o contribuinte tem a vitória.
Como o auto de infração é cancelado, a Fazenda Nacional não consegue recorrer ao Judiciário. E, sendo assim, pelo formato atual, esses temas dificilmente serão discutidos na Justiça. “Viola a lógica do Código de Processo Civil, que é baseada em precedentes. Não existe, no mundo inteiro, uma solução dessas para o processo administrativo tributário”, afirma Gomes. Ele pondera, no entanto, que o fim do voto de qualidade foi decidido pelo Congresso, sancionado sem veto pelo presidente da República e que já há maioria de votos no STF para declarar a nova sistemática constitucional. Por esse motivo, diz, é preciso encontrar um caminho que reequilibre o sistema sem desrespeitar nenhuma dessas decisões. “Nós precisamos debater. Ainda que se chegue num consenso de que não se deve promover qualquer tipo de alteração. Se não houver consenso na comissão, não haverá a inclusão em projeto de lei”, diz. O terceiro tema a ser debatido na subcomissão, no dia 24 deste mês, será a reforma da Lei de Execuções Fiscais. A ministra Regina Helena Costa se refere ao tema como “um dos fatores de morosidade no Judiciário”. “A solução para esse grande problema é complexa, exigindo diversas medidas”, diz. O quarto tema a ser tratado está previsto para entrar em discussão em 7 de junho. Também é tratado como “espinhoso”.
A ideia é elaborar um anteprojeto de lei complementar federal sobre o uso de soluções consensuais aos conflitos tributários – mediação, conciliação e arbitragem. Já no dia 17 de junho entra em pauta o quinto tema: os procedimentos de consulta fiscal. O último tema, previsto para ir a debate no dia 22 de junho, envolve as normas gerais do processo administrativo tributário. O objetivo é acrescentar um capítulo no Código Tributário Nacional com os padrões que devem ser seguidos por União, Estados e municípios. “Causa insegurança e muito desconforto a ausência de padronização dos prazos e da forma de contagem deles”, observa o advogado Leonel Pitzzer, que integra a subcomissão